Nada

Decolamos e estavámos voando
Tranquilos, calmos, quietos
Derepente começa a turbulência
Começa a chover e a gente ainda tá no alto
Começamos a cair, sempre caímos - um pelo outro
Queda livre, você se agarra no meu peito
Daí estamos no meio do oceano, no meio do nada,
No meio da solidão, nos afogando
"Não se preocupa, eu sei nadar
Tu tá salva, aqui dentro tu nunca vai morrer
Daqui de dentro tu não vai sair"
A água invade minha boca e prende as palavras aqui dentro
A água entra pela minha boca da mesma forma que tu entrou aqui dentro: Sem permissão, sem querer
Aqui dentro já tá cheio de água, tá alagado
Tu sabe nadar?

Mesmo Lugar

Comecei a pensar em como seria minha vida se não fosse assim
Pensei em todos os outros lugares que eu poderia ter ido
Todas pessoas que eu poderia ter conhecido
Qual seria o nome dessas pessoas? Onde estão essas pessoas?
Pensar sobre outra vida não é uma coisa legal
É como se eu tivesse que matar tudo que eu já vivi
O quanto eu já vivi na verdade?
Eu sei de todas as vezes que eu fui morto
De todas as pessoas que já me enterraram e começaram outra nova vida
Eu posso matar pessoas, eu posso enterrar sentimentos
Como está você? Vivendo?

Ainda é Cedo

Eu dizia ainda é cedo e você fugia com medo
Eu gritava para você voltar, você olhava para trás e seguia em frente
Tu esqueceu todos os teus medos infantis?
Tudo aquilo que tu queria derrotar?
Eu segurava sua mão nas noites enquanto você tinha pesadelos
Tu me abraçava quando acordava e via que isso era apenas ilusão
Eu sempre fui ilusão, iludido
Tu sempre foi parte de um mundo que nunca existiu
Nós dois sempre fomos a mesma pessoa
A diferença é que eu tinha sonhos

Capítulo LIII

"Pensar que as coisas desta vida hão-de sempre durar, é escusado; antes parece que anda tudo à roda. À Primavera segue-se o Verão, ao Verão o Outono, ao Outono o Inverno, e ao Inverno a Primavera, e assim gira e regira o tempo nesta volta contínua. Só a vida humana corre para o seu fim, ligeira, mais do que o tempo, sem esperar o renovar-se, a não ser na outra, que não tem termos que a limitem." Di-lo Cide Hamet [...] .

#
Miguel de Cervantes, 1615 - O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de la Mancha - Parte 2.

Fingi Na Hora Rir

A: É muito difícil fingir um sorriso quando tudo que tu sente é dor?
B: É mais difícil sentir dor quando tu só tem motivos parar sorrir.

Agora Deixa Esquecer

Tu já cansou de lembrar e me lembrar
E me fazer sofrer por ter esquecido
Esqueci por tanto sofrer ao lembrar
Tu não entendeu isso, meu sofrimento
As tuas lembranças estão tão vivas quanto você
Eu pensei que te matar seria a melhor saída
Mas isso rasga minha pele, quebra meu ossos
Sangra dentro do meu peito
Mexe naquela ferida que tu ajudou a fechar
E o pior de tudo isso, é que eu te fechei aqui dentro
Agora, deixa eu te esquecer

Vida Real

O silêncio do corredor me atormentava
A casa vazia e o frio que entrava pela janela aberta
A janela no corredor.
Passava pelo corredor sem ligar a luz, passei rápido
Liguei a TV apenas para atrazer alguma vida para minha sala
O jornal só passava notícias sobre pessoas que morreram
A guerra ainda continua e eu não saio de casa
A guerra também está dentro da minha casa
Eu luto contra a escuridão; luto para não cometer suicídio
Sento no sofá e olho a TV
Ver pessoas mortas me lembra que estou vivo
E isso me dói feito uma bofetada¹
Queria estar com você, teu rosto já apareceu aqui
A minha coragem de continuar é que sumiu
Queria que fosse o meu rosto aquele que apareceu
Como é que eu troco de canal²?
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1 = Pequena referencia ao Caio Fernando Abreu.
2 = Refrão da música "Vida Real" do Engenheiros do Hawaii.

Capítulo XV

Tomé Cecial, [...], disse ao bacharel:
- [...] Vejamos, pois, agora, quem é mais louco: quem o é porque não o pode deixar de ser, ou quem o é porque assim o quis?
Ao que respondeu Sansón:
- A diferença entre esses dois loucos é que sempre o há de ser quem por força o é, enquanto que quem o é porque quis, deixará de sê-lo quando assim o quiser.

#
Miguel de Cervantes, 1615 - O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de la Mancha - Parte 2.

Poderia Dizer

Tem uma música que me lembra você
Na verdade, há várias músicas que me lembram você
Minto, é só uma frase de uma música
Não pelo que a frase diz, pois ela não diz nada
Você costumava me dizer algo parecido
Gostaria de ouvir você dizer essa frase
Ou qualquer outra frase
Gostaria apenas de ouvir tua voz
Gostaria apenas de esquecer aquela frase
As canções já não me dizem mais nada¹
#
¹ = Parte da música "Muda" do Esteban.
Sobre a música que me refiro no texto, prefiro não dizer qual é.

Meu Mundo

Você sentada na minha frente
Olhava para o lado direito, olhava baixo
Sorria leve e escondia o riso
Eu sentado na tua frente
Olhava teu olhos como se fosse descobrir o mundo
Não sorria, mas queria descobrir o motivo do teu riso

B: Tá rindo de quê?
A: De você.
B: O que eu fiz dessa vez?
A: Nada.
B: Então, tá com esse sorriso por quê?
A: Porque eu te amo.

Engavetado

Tá tudo aqui
Fechado
Esperando
Guardado
Sofrendo
Escondido
Morrendo

Talvez

B: Talvez se tu mudasse
Se tu voltasse a ser quem tu era
Se tu voltasse a viver - esqueça a morte
Talvez se tu me matasse
Quem sabe eu já esteja morto - por dentro
Talvez eu tenha que mudar
Talvez eu tenha que ser quem não sou
Talvez eu tenha que morrer
Enfim, eu poderia te encontrar
A: Tu quer me encontrar?
B: Talvez

Abraço

Eu acho que não durou cincos segundos
Parecia uma eternidade
Tu parada nos meus braços
Nós dois parados em um abraço
Parece que o tempo parou

Fantasma

Eu acordo e vejo fantasma
Eu ando pela rua e vejo fantasma
Eu vou dormir e vejo fantasma
Eu sonho e vejo fantasma
Caralho, tu já morreu!

Sorriso

Tu mudou, eu continuei o mesmo
Eu mudei, tu continuou mudando
Tu prometeu voltar e ser o mesmo de antes
Tu nem sabe quem tu era antes
Te vi na rua dias atrás
Tu me viu e fingiu que sorriu
Aquele mesmo sorriso amarelo

Dance

Outro dia eu pensei que tu ia voltar
A porta tava aberta
Eu tinha decorado a palavra certa
Eu acho que dancei, e nem escutei a música tocar
#
Baseado em "Eu Que Não Amo Você" - Engenheiros do Hawaii

Duas linhas

Tu, tua.
Eu, todo teu.

Semáforo

As pessoas caminhando nas ruas
As crianças e suas mochilas
O sinal da escola, O sinal verde
O sinal fechado, semáforo
O sangue no meio da rua
Eu gritando da calçada
Atropelaram meu cachorro
Queria que fosse você

Falta

B: Oi?
A: Não..
B: Não o quê?
A: É minha resposta.
B: Mas eu ainda não pedi nada.
A: Mas vai perguntar, eu sei.
B: Ah! Não começa!
A: Começar o que?
B: Com isso, tu não me conhece tanto assim.
A: Conheço o suficiente.
B: Tu nem sabe o que eu preciso.
A: O que você precisa?
B: Viu, eu disse.
A: Me diz o que você precisa.
B: Tu não tem o que eu quero.
A: O que você quer ou o que você precisa?
B: Aquilo que te falta.
A: Você me faz falta.
B: Justamente...
A: Você sente sua falta?
B: Sinto a tua.